Desde facilitar compras online até promover novas fontes de renda, as diferentes funcionalidades das redes sociais são tão hegemônicas no nosso cotidiano que imaginar um mundo sem a presença delas se tornou impossível. Apesar de sua permanência na vida das pessoas ser uma certeza absoluta, muitas mudanças atravessaram este universo ao longo dos anos, e adeptos têm colocado em xeque o domínio intacto das principais plataformas. Há quem ache que o Facebook está morrendo, outros criticam as mudanças no Instagram e ainda tem aqueles que demonstram preconceito com as “dancinhas” do TikTok. O fato é que Instagram (123 milhões de usuários), Facebook (112 milhões de usuários) e TikTok (85 milhões de usuários) hoje são as principais redes sociais do país em número de usuários (desconsiderando o YouTube e o WhatsApp, que não estimulam a exposição da interação social) e disputam um mercado de atenção cada vez mais disputado. O site da Jovem Pan entrevistou consultores do ramo em reportagem especial dividida em duas para analisar as tendências das diferentes redes sociais para 2023.
O Facebook vai morrer?
Tida como a maior rede social do mundo, com 2,9 bilhões de contas ativas, há quem diga que o Facebook está morrendo. A justificativa seria uma desaceleração no número de usuários e, em alguns países, uma tendência de queda nos números de contas ativas na plataforma. Entretanto, como aponta Rafael Kiso, fundador e CMO da mLabs, o declínio não é tão certeiro e tem a ver com a maturidade digital de cada país: “Tem países em que o Facebook cresce e tem países em que o Facebook decresce. Qual é a grande diferença? Os países que já estão mais avançados digitalmente, em termos de presença digital, já estão vivenciando uma fase de transição para o Instagram, e também TikTok. E tem países que estão menos avançados do que o Brasil, por exemplo, e que estão vivenciando o Facebook no seu auge. Tem momentos diferentes em termos de maturidade digital e mercado, em termos de presença digital. Isso já mostra que o Facebook, em geral, não está morrendo, porque é muito grande”.
Para o diretor de marketing, novas funcionalidades como aplicativos de namoro, marketplace e assinaturas de grupos foram uma tentativa de dar sobrevida ao Facebook e reter usuários, o que não tem funcionado no Brasil. O Facebook tinha 125 milhões de usuários em outubro de 2021, número que caiu para 112 milhões em novembro de 2022, o que confirma a tendência de queda da rede social de Mark Zuckerberg, como explicou Kiso: “O Facebook também perdeu o favoritismo. Já foi um dia a plataforma de rede social favorita do mundo, hoje não é mais. Quem tomou o posto é o WhatsApp, que também é do grupo da Meta. Hoje, o Facebook está em segundo lugar, com 14,6% do favoritismo dos usuários pesquisados. No entanto, o Instagram está empatado tecnicamente com o Facebook, porque vem crescendo e está com 14,5% do favoritismo dos participantes. Estão praticamente empatados”.
“Se a gente fosse fazer agora essa pesquisa novamente, provavelmente o Instagram já teria passado o Facebook, posicionado em segundo lugar”, aposta o analista. Kiso também aponta para a debandada das marcas, insatisfeitas com o péssimo engajamento que é entregue hoje pela plataforma: “O engajamento das páginas comerciais dentro do Facebook caiu para praticamente zero. A gente tá falando de um engajamento médio de um post de um perfil, entre 10 e 100 mil seguidores, de 0.21%, o que é praticamente zero. Para as páginas que têm mais de 100 mil likes o engajamento ficou em torno de 0.05%. Então, as próprias marcas estão saindo do Facebook em termos de presença e posts, pelo menos aqui no Brasil, e dando mais ênfase a Instagram e TikTok”.
Alexandre Inagaki, que é diretor da PEPN Comunicação Digital, também concorda com a tendência e vê um futuro de integração do Facebook com as outras redes sociais do grupo Meta: “Quando a gente entra na interface mobile do Facebook a gente vê que tem atalhos para marketplace, para os Instagram Reels e Facebook Watch. Acho difícil hoje em dia a gente pensar no Facebook como uma plataforma autônoma, quando ela está cada vez mais integrada, tanto ao Instagram quanto ao WhatsApp. O futuro do Facebook é ir se solidificando através de outras ramificações que já não têm como principal business aquela timeline que a gente costumava visualizar”.
Instagram vs TikTok
Para tentar competir com o fenômeno global do TikTok, o Instagram criou os Reels, funcionalidade da plataforma que simula a interface de vídeos curtos da rede social chinesa. Em 2022, tal medida chegou a ser criticada por usuários gigantescos como as modelos Kylie Jenner e Kim Kardashian, que impulsionaram a campanha “Façam o Instagram ser o Instagram de novo” — uma crítica à prioridade que a rede social deu aos vídeos em detrimento das tradicionais fotos na linha do tempo. Para Inagaki, este fenômeno já era esperado: “O Instagram é a plataforma de experimentações da Meta. Assim como a gente viu várias funcionalidades que foram copiadas de concorrentes diretos, desde os Reels até os Stories, o Instagram vai continuar servindo como essa rede na qual a Meta faz experimentações, que depois podem implementados para as demais ramificações da empesa, como Facebook e WhatsApp”.
“E vai continuar investindo forte em conteúdos audiovisuais. A gente percebe a grande tendência nessa economia da atenção, das pessoas recorrerem cada vez mais ao consumo de conteúdos de vídeos curtos. A tendência é meio inevitável nesse sentido. Sim, o Instagram vai continuar tendo as fotos tradicionais, os carrosséis de imagens e a gente vai poder continuar consumindo conteúdos de diversos tipos. É uma plataforma que está muito bem consolidada, até porque já surgiu para ser consumida em dispositivos móveis. No final das contas, foi um grande acerto do Zuckerberg ter adquirido o Instagram, porque é a plataforma que realmente caiu no gosto de quem consome conteúdo primariamente em dispositivos móveis”, analisa.
Apesar do histórico positivo do Instagram em se adaptar para lidar com outras plataformas concorrentes, Rafael Kiso avalia que a disputa ainda está longe de ser ganha pela rede social da Meta. “Segundo uma declaração recente do Mark Zuckerberg, hoje os Reels já representam 50% do total do tempo gasto em vídeos do TikTok. Obviamente, o Reels nasceu depois do TikTok e, por esse fato, chegar à metade do tempo que as pessoas gastam na rede rival já é uma conquista, na minha visão. Ainda está atrás do TikTok em si, mas conseguiram reter muitos usuários dentro do Instagram. O Brasil acho que foi o primeiro país a testar o Reels no mundo para tentar frear um pouco a entrada do TikTok em países onde não tinha uma presença muito definitiva. Não surtiu tanto efeito.”
“O TikTok, em contrapartida, investiu bastante em publicidade, saindo inclusive do ambiente digital. Foi para os estádios, foi para a televisão, foi para eventos. Se tornou uma marca muito conhecida. Criaram um relacionamento muito forte com as marcas anunciantes, já vem faturando e produzindo inúmeros casos de sucesso de marcas que vendem mais no TikTok e criadores que nasceram no TikTok e hoje são famosos. Principalmente na questão de negócios, saíram desse posicionamento de ‘dancinha’ para o posicionamento de ser uma plataforma onde você, inclusive, encontra produtos para comprar, onde você descobre novidades. Tem uma jogada do TikTok em ser mais como o YouTube, ser um buscador também, algo de inspiração e baseado em entretenimento, o que retém mais usuários. Por isso que o Instagram, com o Reels, não chegou a bater o tempo de retenção que o TikTok tem, justamente porque o Instagram tem outros formatos que não são vídeos”, avalia.
Apesar de ser uma briga difícil em termos de audiência, o diretor de marketing da mLabs destaca que o Instagram tem feito um bom trabalho para não perder usuários. “Ao contrário do Facebook, o Instagram tinha 112 milhões de usuários ativos em julho de 2021. Hoje tem 123 milhões de usuários brasileiros ativos. O Instagram, neste momento, é maior do que o Facebook, no Brasil, e é maior do que o TikTok no Brasil, que havia batido 85 milhões de usuários em novembro de 2022. Então, o Instagram tem conseguido reter esses usuários, que não saíram de lá para o TikTok, essa é essa parte boa da questão do Reels.”
Para Alexandre Inagaki, o grande diferencial do TikTok está no algoritmo usado pela plataforma para sugerir novos conteúdos. “Enquanto as redes sociais, em geral, parecem valorizar conteúdos que sejam mais polêmicos e acabem rendendo maior engajamento, nessa história toda de posts, que, de alguma maneira, incitam a raiva ou a polarização, o TikTok é uma plataforma muito lúdica. A gente viu um grande crescimento do TikTok durante a pandemia, quando as pessoas tinham uma maior necessidade de consumir conteúdos que de alguma maneira nos trouxessem mais entretenimento. Também é uma rede social que independe dos grandes influenciadores tradicionais.”
A novidade da dinâmica da rede social chinesa e o advento dos desafios também é exaltado por Rafael Kiso. “TikTok no Brasil vai crescer ainda mais em 2023 porque agora está caindo a ficha de muita gente que tinha preconceito. Cada vez mais outras pessoas o usam e criam. É mais fácil criar conteúdo no TikTok, porque lá não é feio copiar o conteúdo dos outros. Na prática, isso faz parte da dinâmica do TikTok, você pode entrar nas trends e desafios. Esse é o grande diferencial, você pode criar conteúdo muito facilmente sem precisar ser criativo. É só você copiar o que os outros estão fazendo, entrar em uma trend e ter visibilidade sem ter seguidores. Você não precisa ter seguidor para ter visibilidade, esse é o ponto. Essa é a dinâmica principal do TikTok, ao contrário de outras plataformas como o próprio Instagram, em que você tem que conquistar uma audiência para ter visibilidade, tem que conquistar seguidores para ter visibilidade”, explica.
Apesar da aparente “lua de mel” do TikTok com o público, Inagaki alerta para problemas no horizonte da plataforma envolvendo a sua relação de poder com a China e os Estados Unidos. “O grande desafio do TikTok vai ser principalmente enfrentar as pressões políticas que estão surgindo nos Estados Unidos. Dispositivos governamentais nos Estados Unidos não podem ter o aplicativo do TikTok baixado, por exemplo. E, na China, o próprio governo da está pressionando para que o CEO da ByteDance se desligue da empresa. Essas pressões que ocorrem tanto internamente, na China, como extremamente, nos Estados Unidos, vão ser decisivas para a gente ficar de olho em como vai ser o futuro na plataforma em 2023.”